O Projeto de Lei 5.452/2016 estabelece a inclusão da divulgação de cena de estupro no Código Penal e o aumento de pena para o estupro cometido por duas ou mais pessoas.
No entanto, com a justificativa de que a atual lei não faz distinção entre os tipos de agressão, o autor do PL, deputado federal, Fabio Ramalho, elaborou um parecer que propõe a redução da pena para os casos de estupro de vulnerável se o ato não envolver penetração ou sexo oral.
Entre outros pontos, a proposta prevê a redução da pena “quando o ato libidinoso, distinto da conjunção carnal, não for praticado com violência física ou psicológica e não consistir na introdução de membro, órgão ou objeto nas cavidades vaginal, oral ou anal da vítima”.
Previsto no Código Penal, o estupro de vulnerável consiste na conjunção carnal ou na prática e permissão de qualquer ato libidinoso com menores de 14 anos. Pela lei, qualquer pessoa que pratique os crimes contra crianças e adolescentes poderá responder a pena de 8 a 15 anos.
Em roda de conversa, a Ordem dos Advogados do Brasil, em Sergipe, iniciando uma mobilização estadual contra a violência sexual, o abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes, colocou em discussão nesta quarta-feira, 18, as perdas e os retrocessos que a aprovação do Projeto de Lei acarretará em relação às crianças e adolescentes vítimas dos crimes de violência sexual, do abuso e da exploração sexual infantil.
Na ocasião, a vice-presidente da Comissão da Infância, Adolescência e Juventude da OAB/SE, Acácia Gardênia Santos Lelis, defendeu que a proposta de designar uma escala de gravidade entre os atos de violência representa um grave retrocesso nos direitos da juventude.
“A proposta que se coloca é de que a pena atual de 8 a 15 anos, ‘quando não houver grave violação ou danos à vítima’, é uma pena muito dura. Porém, não é exclusividade apenas da penetração ou do sexo oral a capacidade de causar graves danos à vítima”, considerou.
Na roda de conversa, a secretária-geral da Comissão, Maristela Tomas dos Santos, esclareceu que a proposta do PL prevê ainda que, “quando o ato não importar em grave invasão da intimidade da vítima ou em situação de sua humilhação, a pena poderá ser reduzida”.
Essa, para ela, é uma análise extremamente subjetiva. “Como avaliar isso, por exemplo, no caso de uma vítima bebê? O discurso que sustenta a proposta dá um tom de menor relevância às situações que são sim sérias e que nem sempre são consideradas pelo Judiciário”, afirmou.
Em sua fala, a presidente da Comissão, Glícia Salmeron, reafirmou a importância de discutir o tema e relembrou o papel das instituições públicas e privadas, da sociedade e dos agentes da Rede de proteção às crianças e adolescentes no combate a esse tipo de proposta legislativa, devendo envolver a todas as pessoas e manifestando-se contra a aprovação do Projeto de Lei.
“Nós temos que levar em conta que muitas vezes o processo judicial não é humanizado e sim analisado no âmbito do que prevê a Lei, de forma a não garantir as questões e danos de forma subjetiva e principalmente quando envolve danos que são difíceis de alcançar a sua dimensão, especialmente se tratando de criança e adolescente. No Sistema de Justiça, é difícil fazer uma avaliação das decisões no campo do direito penal, sem o apego ao princípio da formalidade. Esse é mais um dos projetos silenciosos que são aprovados sem a participação e discussão ampla de acordo com a necessidade social e conscientização da sociedade”.
No evento, o vice-presidente da OAB/SE, Inácio Krauss, enfatizou a atuação da Comissão na defesa dos direitos da criança, adolescente e juventude. “Sei como é difícil juntar pessoas interessadas na causa. Infelizmente, poucos compreendem que essa é uma causa que se trata do futuro do país”.
A roda de conversa reuniu especialistas, advogados, juízes e representantes da rede de proteção aos direitos da criança e do adolescente. Os participantes foram incisivos e demonstraram a necessidade de debate e discussão do PL, enfatizando a necessidade de ser considerada de forma prioritária a situação da vítima, enquanto sujeito de direitos.
Na ocasião, os participantes elaboraram e assinaram uma carta que será enviada ao Poder Legislativo na qual recomendam a não aprovação do projeto de lei, no que diz respeito à diminuição da pena, “pois o acolhimento do texto é um retrocesso na proteção integral dos direitos dos vulneráveis, despreza sua condição de pessoa humana e sujeito de direitos”.
Além disso, o encontro colocou em debate ainda o aspecto psicológico da vítima; as ações socioeducativas; a necessidade de ampliação do conceito da perícia médica; a atuação dos atores da Rede nos casos de abuso e exploração sexual infantil; o machismo e o conservadorismo presente da sociedade; a falta de estrutura nos Conselhos Tutelares; e a necessidade da denúncia.
As denúncias de abuso ou exploração sexual de crianças e adolescentes podem ser feitas no Conselho Tutelar mais próximo, nas delegacias, no Ministério Público, nos Conselhos de Direitos, no Disque Denúncia Nacional – Disque 100, um serviço de utilidade pública que recebe e encaminha denúncias de violências contra meninos e meninas.
Além de violência sexual, o Disque 100 recebe denúncias relacionadas a todos os tipos de violência, seja de natureza física ou psicológica. A ligação para o serviço público é gratuita e o usuário não precisa se identificar. O Disque 100 funciona todos os dias, das 8 às 22 horas. Em seis anos, foram mais de 95 mil denúncias e 2,2 milhões de ligações atendidas – entre elas dúvidas e sugestões.