O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, em Sergipe, Henri Clay Andrade, concedeu entrevista ao Jornal da Cidade sobre a criação do Comitê de Defesa dos Direitos Sociais e as reformas trabalhista e previdenciária. Para ele, as premissas são falaciosas e as consequências são graves para os trabalhadores e as próximas gerações.
Leia abaixo a matéria:
Para Henri Clay Andrade, “as reformas trabalhistas e previdenciárias pretendidas significam retrocessos sociais seculares e sem precedente na história. As premissas são falaciosas e as consequências são brutais para a vida dos trabalhadores e de gerações futuras. Defendemos o referendo popular, precedido de amplo debate nacional. Se o governo está bem intencionado e seguro das suas propostas, não há razão para evitar o debate e temer a decisão do povo por meio do referendo”.
Na entrevista, o Presidente da OAB/SE falou sobre o lançamento do comitê de defesa dos direitos sociais, realizado na segunda-feira, dia 13. Lançado pela OAB/SE, pela Arquidiocese de Aracaju e pela União dos bispos evangélicos de Sergipe, hoje o comitê já conta com o engajamento de instituições de peso, a exemplo da AMASE, AMATRA, ANPT e MST e várias entidades dos movimentos sociais e sindicais. Segundo Henri Clay Andrade, o comitê visa “fazer ampla mobilização popular contra as reformas da previdência e trabalhista que estão tramitando no Congresso Nacional em regime de urgência, sem nenhum debate social. Vamos lutar para que haja consulta ao povo, através de referendo popular, como pressuposto de validade para as reformas.”
Jornal da Cidade – Qual foi o objetivo da criação do comitê de defesa dos direitos sociais?
Henri Clay Andrade – Neste primeiro momento o comitê visa aglutinar forças sociais e instituições democráticas para mobilizar, informar, debater e se posicionar sobre as reformas trabalhistas e previdenciárias pretendidas pelo Governo Michel Temer e que já estão tramitando no Congresso Nacional.
JC – Quais as atividades e as ações que o comitê promoverá?
HC – O Governo Temer quer aprovar as reformas da previdência e trabalhista ainda neste primeiro semestre. E é por isso que os projetos tramitam no Congresso Nacional a “toque de caixa e repique de sino, ou seja, sem maiores informações, sem debate, sem participação cidadã. Agora é fundamental que consigamos acabar com o regime de urgência na tramitação dos projetos, para que a sociedade possa ter a oportunidade de melhor se informar e debater sobre a necessidade ou não das reformas e também amadurecer sobre quais as alternativas para sairmos da crise econômica e política para o fim de restabelecermos o desenvolvimento do país.
JC – Na avaliação da OAB/SE, as reformas trabalhistas e previdenciárias são necessárias para debelar a crise econômica e de que maneira afetarão a população?
HC – Entendemos que a previdência não é deficitária e nem a legislação trabalhista é a causa da crise econômica. Logo elas não são necessárias e nem são as alternativas eficientes para o desenvolvimento do Brasil. As reformas pretendidas atingem gravemente a vida de todos os cidadãos e de futuras gerações. E mudam radicalmente a concepção do Estado brasileiro, porque reduzem drasticamente direitos sociais fundamentais. Portanto, face à acentuada relevância social, defendemos que essas reformas sejam submetidas à consulta popular, através de referendo, previsto no art. 14, da Constituição Federal. Isto é, reivindicamos que o referendo seja o pressuposto de validade para as reformas pretendidas. Isso garante amplo debate nacional e prioriza a democracia participativa.
JC – Quais os pontos mais críticos dos projetos que tramitam no Congresso Nacional em relação à reforma trabalhista?
HC – Os projetos de reforma trabalhista visam desregulamentar o princípio normativo essencial do direito do trabalho, que é a: proteção ao trabalhador. A terceirização ampla, geral e irrestrita e a prevalência do negociado sobre o legislado significam graves retrocessos na relação trabalhista, porque possibilitam reduzir direitos mínimos que asseguram a dignidade na relação de emprego. Se esses projetos forem aprovados, haverá um retrocesso social sem precedentes, porque os salários ficarão mais baixos, as condições de trabalho e de segurança serão precarizadas, os direitos mínimos previstos na legislação, como décimo terceiro salário, férias, FGTS, jornada de trabalho, poderão ser negociados com prevalência sobre o que prevê a lei, mesmo que seja em condições desfavoráveis ao trabalhador. Enfim, essa reforma enfraquece muito a classe trabalhadora, a sua organização sindical e a própria Justiça do Trabalho.
JC – E em relação à reforma da previdência?
HC – O projeto apresentado pelo Governo Temer é muito duro com os trabalhadores e também representa graves reduções de direitos sociais. A pretendida reforma prevê, dentre outros retrocessos, o aumento do tempo de contribuição para a previdência para 49 anos e o aumento da idade mínima para aposentadoria para 65 anos, tanto homem como mulher. Também o governo quer acabar com a cumulação dos benefícios da aposentadoria com a pensão decorrente da morte do cônjuge, ou seja, se a reforma for aprovada, os cidadãos terão que optar entre receber o valor da sua aposentadoria ou apenas 60% do valor da pensão. Na prática, os trabalhadores dificilmente conseguirão gozar a aposentadoria e, caso alcance essa façanha, receberão valor bem mais baixo. São absurdos como estes que a OAB/SE é contra e o comitê de defesa dos direitos sociais vai combater.
JC – O déficit na previdência social é a principal justificativa do Governo ao apresentar o projeto de reforma da previdência. A OAB/SE afirmou recentemente que a previdência não é deficitária? Com quais fundamentos a entidade chegou a essa conclusão?
HC – A premissa do Governo Temer para a reforma da previdência é falsa. Chega a ser cinismo afirmar que há um rombo na previdência. Ao contrário, o sistema de seguridade social é superavitário. A conta é simples e os dados são oficiais. O sistema arrecadou R$ 700 bilhões e foram gastos R$ 688 bilhões. O que de fato ocorre é uma sangria decorrente da desvinculação das contribuições sociais. Por exemplo, em 2015 o governo federal desvinculou R$ 66 bilhões da seguridade social para outras finalidades, causando um desequilíbrio ao sistema securitário. Portanto, a causa do problema não é do sistema de seguridade social, mas a prática de transferência anual de parte dos recursos da seguridade social para outros fins. Essa sangria é que tem que acabar.