Em audiência pública, a Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Ordem dos Advogados do Brasil, em Sergipe, a Frente Parlamentar em Defesa das Mulheres da Assembleia Legislativa de Sergipe e demais parceiros, colocarão em debate na próxima sexta-feira, 17, a mídia e a misoginia.
Em entrevista à OAB/SE, a vice-presidente da Comissão, Valdilene Oliveira Martins, declarou que a audiência tem o objetivo de fazer um alerta à população, além de suscitar uma discussão sobre a postura de alguns empresários e profissionais da comunicação, com relação à divulgação de eventos, à criação de propagandas, à forma de noticiar fatos e de elaborar reportagens, quando a figura feminina está envolvida. Para ela, a misoginia está diretamente relacionada à violência que é praticada contra a mulher na sociedade.
A audiência será realizada, às 9 horas, na Assembleia Legislativa de Sergipe, localizada na Av. Ivo do Prado, Bairro Centro.
Confira a entrevista:
ASCOM – Dra. Valdilene, nós sabemos que a misoginia está presente em todo o meio social. Para a senhora, qual é o primeiro passo para combater a coisificação da mulher enquanto ser humano?
Valdilene –No meu entendimento, o primeiro passo a ser dado deve ser dentro do seio familiar, revendo a forma de criação e educação, que é pré-estabelecida para meninas e meninos.
Precisamos entender que as diferenças entre os sexos não são naturais, elas são socialmente construídas. Vivemos em uma sociedade sexista, com base no patriarcado e, quando nascemos, já encontramos papéis pré-definidos, em função do sexo e, consequentemente, a preocupação, os cuidados e os ensinamentos familiares, para meninos e meninas, são diferenciados. Desde cedo o direito de ir e vir da mulher é cerceado. A ela é ensinado que sua vida deve ser limitada a existência do homem, fazendo com que a visão equitativa fique prejudicada.
O resultado de tudo isso é o estabelecimento de uma suposta supremacia masculina, que reduz a mulher ao patamar das necessidades fisiológicas e de consumo do homem.
A condição de acessório, atribuída a mulher, resulta na mercantilização do seu corpo, que passa a ser utilizado como meio de atrair ou de chamar a atenção do homem, fazendo com que ela deixe de ser vista como um ser humano.
ASCOM – A mídia é um instrumento fundamental para a luta pela igualdade de gênero. No entanto, é também uma ferramenta de disseminação do ódio à mulher. Como essa realidade pode ser mudada? Já existe alguma lei que proíba esse tipo de conteúdo? Se sim, está sendo efetivada?
Valdilene –Infelizmente, a mídia tem um papel fundamental na violação dos direitos da mulher. São propagandas, programas de tv, notícias, novelas, personagens, músicas, dentre outras coisas, que estigmatizam a mulher e estimulam, principalmente, as violências física e sexual.
Quando as políticas públicas que combatam a violência e a discriminação contra a mulher forem efetivamente implementadas; quando o trabalho em rede, para atendimento às mulheres vítimas fluir de forma mais plena; quando os profissionais da comunicação começarem a se preocupar em dispensar um tratamento respeitoso e equitativo a mulher, a conscientização social virá como consequência; daí por diante, com certeza essa visão pejorativa do feminino, aos poucos, será mudada.
A lei que deveria ser primeiramente observada, com relação a esse tipo de conteúdo, penso eu, deveria ser a Constituição Federal vigente, que foi a primeira constituição brasileira a dizer, explicitamente, em seu texto, que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, portanto, se a Carta Magna fosse, de fato, observada, não haveria esse tipo de “tratamento diferenciado” para com as mulheres e não seriam necessárias as criações de outras leis.
Em alguns Estados, por exemplo, existem leis para que proíbem as músicas que depreciam a mulher, mas, além das músicas, existem inúmeros outros espaços onde a misoginia pode ser encontrada e esse fato, nem sempre é de fácil percepção, ao meu ver, os governos, os gestores, as instituições, públicas/privadas e, consequentemente, a sociedade já começaram a perceber que no mundo moderno e livre em que vivemos hoje, as práticas misóginas não são mais cabíveis, pois o nível de desenvolvimento de uma sociedade também é medido pela liberdade e pela forma como são tratadas as pessoas que dela fazem parte, sem que haja quaisquer tipos de distinções.
ASCOM – A Comissão defende que a igualdade de gênero é uma luta de todos, protagonizada pela mulher. Qual o principal caminho para que a sociedade compreenda isso?
Valdilene –A primeira coisa a ser buscada para a viabilização de um entendimento coletivo é a parceria entre homens e mulheres.
Temos que trabalhar por uma consciência de que a luta pela equidade de gênero é do ser humano e que alcançá-la será uma evolução social, que só trará benefícios latu sensu.
Vale destacar que as mulheres não buscam a inversão de uma suposta supremacia, mas sim o estabelecimento de uma equidade.
A equidade vai além da igualdade porque também viabiliza a justiça.
A luta feminista é para que a mulher tenha poder sobre ela mesma e não sobre o homem.
Eu sou feminista, tenho orgulho de sê-lo e se alguém acredita na equidade de gênero, este alguém também o é, independentemente do gênero a que pertença.
“A humanidade assemelha-se a uma ave com suas duas asas – uma é o homem, a outra a mulher. A ave, a menos que ambas as asas sejam fortes e impelidas por uma força comum, não pode voar rumo ao céu.” Abdul’-Bahá